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PARECE, MAS NÃO É Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil deve suspender captação e uso de nome e logo similares aos da OAB
Por entender que a Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil (OACB) se utiliza de sigla e símbolos similares aos pertencentes à Ordem dos Advogados do Brasil, o juiz Diego Câmara, da 17ª Vara Federal do Distrito Federal, ordenou que a associação suspenda, imediatamente, qualquer atividade de prestação de serviços jurídicos e a veiculação de publicidade para captação de clientes.
Foto: Raul Spinassé/CFOAB
Associação de advogados conservadores está proibida de oferecer serviços jurídicos
O juiz também proibiu a associação de utilizar o nome “Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil – OACB” sob pena de multa diária de R$ 20 mil.
A decisão foi provocada por ação civil pública ajuizada pelo Conselho Federal da OAB. A entidade sustenta que os advogados que integrem a OACB somente poderiam prestar serviços à própria associação, sendo vedada a sua utilização para captar clientela em benefício individual.
A OAB Nacional também sustenta que o artigo 16 do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94) estabelece que são proibidas as sociedades de advogados que apresentem forma ou característica de sociedade empresarial, que adotem nome fantasia ou realizem atividades estranhas à advocacia.
Ao analisar o caso, o magistrado apontou que a similaridade entre a sigla e o logo da entidade privada com aqueles usados pela OAB poderia induzir a sociedade a erro.
Segundo ele, a comparação entre a identidade visual da OAB, instituída há anos, e a da OACB, recentemente criada, corrobora “a arguição pela existência de proximidade capaz de gerar confusão ou induzir em erro pessoas de menor conhecimento jurídico e institucional que, por ventura, venham a ter acesso às publicações referenciadas neste caderno processual ou mesmo a buscar algum dos serviços disponibilizados pelo conselho de classe”.
O juiz também citou capturas de tela que demonstram que a entidade que busca congregar advogados conservadores tem feito postagens na internet que incentivam o envio de vídeos, fotos ou qualquer outro tipo de postagem ofensiva ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), sua família e membros do seu governo ao seu endereço eletrônico. Nas mesmas postagens, a associação afirma que sua equipe de advogados providenciará o encaminhamento de notícia crime contra os autores das ofensas.
“Assim, o quadro fático exposto sinaliza que a associação requerida viria atuando, seja de forma direta ou por intermédio dos seus associados, na prestação de serviços jurídicos, em situação apta a configurar, no último caso, hipótese de captação de clientela, consubstanciada no redirecionamento das causas potenciais de que tomava conhecimento aos procuradores integrantes dos seus quadros”, resumiu._
STF absolve condenado por furtar itens da decoração de Natal
Por maioria de votos, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual encerrada em 19 de abril, absolveu um homem condenado por furtar 20 metros de fio e 10 lâmpadas da iluminação de Natal de Florianópolis, avaliados em R$ 250.
FreepikÁrvore de Natal
Homem foi acusado de roubar enfeites de Natal
Ele havia sido condenado pela 1ª Vara Criminal de Florianópolis à pena de 1 ano, 3 meses e 5 dias de reclusão, em regime fechado, e ao pagamento de 11 dias-multa pelo furto de itens da decoração natalina. Em seguida, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina deu provimento ao recurso de apelação do Ministério Público de Santa Catarina e aumentou a pena para 1 ano, 8 meses e 6 dias de reclusão e 15 dias-multa.
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, rejeitou habeas corpus lá impetrado negando a aplicação do princípio da insignificância. O princípio prevê que não se considere crime a conduta pouco ofensiva, que não represente perigo para sociedade, apresente baixo grau de reprovação, e a lesão provocada seja inexpressiva.
A Defensoria Pública da União, que representou o condenado, reiterou no STF o pedido de aplicação do princípio da insignificância. O relator, ministro Gilmar Mendes, atendeu ao pedido e absolveu o réu. Em seguida, o MP-SC recorreu dessa decisão.
No julgamento do agravo, o ministro Gilmar Mendes reiterou os fundamentos de sua decisão monocrática. A seu ver, as circunstâncias peculiares do caso, como os objetos furtados e seu valor, somada à mínima ofensividade da conduta, à ausência de periculosidade da ação e de lesão significativa ao patrimônio tornam imperativa aplicação do princípio da insignificância.
Para Mendes, não é razoável que o Direito Penal e todo o aparelho do Estado se movimentem no sentido de atribuir relevância à hipótese de furto de 20 metros de fio, com dez lâmpadas, de decoração natalina.
Ainda na avaliação do ministro, o fato de o homem ser reincidente em crimes contra o patrimônio não afasta a aplicação do princípio. Em seu entendimento, para incidência do princípio, devem ser analisadas as circunstâncias objetivas em que se deu a prática do delito, e não os atributos inerentes a quem o cometeu. O voto do relator foi seguido pelos ministros Edson Fachin e Dias Toffoli.
Ficaram vencidos os ministros André Mendonça e Nunes Marques, para quem a reincidência afasta o reconhecimento da insignificância. Com informações da assessoria de imprensa do STF._
Veto a sustentações orais abre conflito entre o Supremo e a advocacia
A temperatura do debate entre o Supremo Tribunal Federal e a Ordem dos Advogados do Brasil subiu nas últimas semanas. E ela atingiu o ponto mais alto quando, em um julgamento da 1ª Turma da corte, foi negada pelo ministro Alexandre de Moraes uma sustentação oral em agravo regimental solicitada pelo criminalista Alberto Toron.
Reprodução
Veto a sustentação oral abre crise entre OAB Nacional e o Supremo
De modo cortês, o advogado manifestou sua contrariedade com a atitude do magistrado: “Respeito o entendimento de Vossa Excelência, de seus eminentes pares, e nós sabemos que o regimento interno deste egrégio Supremo Tribunal Federal veda sustentações orais em agravos regimentais. Porém, a Lei 14.365 expressamente regulou a matéria de forma diferente. Ambas as leis tratam do mesmíssimo assunto, só que uma é posterior à outra. E esse critério da cronologia deveria prevalecer”.
Na tréplica, o ministro disse que o regimento interno da corte prevalece sobre a lei e reafirmou que não há sustentação oral em agravo regimental, após consultar rapidamente os outros integrantes da 1ª Turma. Toron aceitou a decisão, mas fez a ressalva de que apenas ouvindo outras vozes a corte se eleva.
Em resposta ao incidente entre Toron e Alexandre, o presidente do Conselho Federal da OAB (CFOAB), Beto Simonetti, disse que a entidade já começou a preparar uma proposta de emenda constitucional para garantir o direito dos advogados de fazer a sustentação oral em qualquer situação.
“Apresentaremos uma PEC para que acabe a discussão se o que vale mais é o regimento de um tribunal ou o Estatuto da Advocacia, que é regido por uma lei federal, e é onde estão descritos todos os nossos direitos. O direito de que nós possamos, da tribuna sagrada, representar o povo brasileiro, retirando suas angústias, desfazendo as injustiças perpetradas contra o cidadão do Brasil.”
Por meio de nota enviada à revista eletrônica Consultor Jurídico, Simonetti lembrou que o CFOAB vem manifestando sua procupação com o assunto desde que o STF decidiu pautar para o Plenário Virtual as ações relacionadas aos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
“A OAB está em busca de garantir um direito que é da advocacia e da cidadania, mantendo nosso respeito pelo STF e pelo uso das vias institucionais. A OAB é legítima para propor esse debate sobre uma PEC para assegurar as sustentações orais e prerrogativas da advocacia. Tentamos o diálogo desde o início da gestão, em 2022, mas isso tem se mostrado insuficiente. Por isso nós vamos buscar esclarecer a questão através de uma PEC.”
A presidente da seccional paulista da OAB, Patrícia Vanzolini, reforça o discurso de Simonetti. Ela destaca que o Estatuto da Advocacia foi alterado em 2022 para garantir especificamente o direito à sustentação oral em agravo tirado de decisão monocrática, e que, quase dois anos depois, essa determinação legal continua sendo descumprida.
“Embora não seja desejada a contraposição entre poderes da República, a verdade é que era necessária uma medida prática para assegurar a participação da advocacia, que vocaliza a voz da cidadania. Nessa linha, a título de exemplo, a OAB-SP apresentou projeto de lei (PL 4.359) que insere no rol das nulidades previstas no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal o ato realizado com desrespeito às prerrogativas profissionais”, afirmou Patrícia.
Sem surpresa
A norma que barra as sustentações consta no artigo 131, parágrafo 2, do regimento interno do Supremo. De acordo com o trecho, “não haverá sustentação oral nos julgamentos de agravo, embargos declaratórios, arguição de suspeição e medida cautelar”.
Segundo ministros do STF consultados pela ConJur, como o regimento interno da corte tem força de lei, a medida vale para o Plenário e para as duas turmas, ainda que o entendimento já tenha comportado exceções.
No HC 152.676, por exemplo, a 2ª Turma atendeu a um pedido feito por Toron, admitindo a sustentação oral em agravo interno no caso que levou à revogação da prisão de Aldemir Bendine, ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras. Na ocasião, apenas o ministro Edson Fachin se opôs à fala da defesa. A decisão é de abril de 2019.
Um ano depois, em sessão encerrada em 30 de abril de 2020, o Plenário do STF apreciou o mesmo tema no HC 164.593 e decidiu de forma inversa.
Na ocasião, a corte firmou que, no âmbito da jurisdição do Supremo, “não cabe sustentação oral em agravo regimental de decisão monocrática proferida por relator em sede de HC”.
De acordo com ministros, levando em conta tanto a definição do tema no julgamento do Habeas Corpus quanto a regra prevista no regimento interno, não seria possível alegar surpresa quanto à vedação de sustentações orais em agravos, ainda que eles entendam o pleito da advocacia.
Alguns ministros também afirmaram que, apesar de a Lei 14.365/2022 ter ampliado as possibilidades de sustentação oral e ser usada como argumento para sustentar a viabilidade da sustentação em agravos, deve prevalecer o princípio da especialidade.
Segundo esse princípio, diante de conflito aparente entre normas, a regra específica, como a prevista no regimento interno do Supremo, deverá prevalecer sobre a regra geral.
Líquido e certo
Na opinião do constitucionalista Lenio Streck, a OAB tem razão na querela com o Supremo sobre as sustentações orais, mas ele é resistente à ideia de uma proposta de emenda à Constituição.
“Não pegaria bem para o Brasil ter de colocar na CF um dispositivo garantindo sustentação oral a advogado. A Constituição do Império dizia, no Art. 178, que só é constitucional o que diz respeito aos limites e atribuições respectivas dos poderes políticos, e aos direitos políticos e individuais dos cidadãos. Tudo o que não é constitucional pode ser alterado sem as formalidades referidas, pelas legislaturas ordinárias. Temos de ter cuidado. Caso contrário, banalizamos a matéria constitucional.”
Streck lembra que a garantia da sustentação oral aos advogados já está prevista em lei e diz que o STF tem interpretado equivocadamente a questão. “Observe-se que, mesmo que haja uma emenda constitucional, ainda assim o STF poderia dizer que isso não é matéria constitucional ou algo assim. Por isso, temos de fazer ‘conversas constitucionais’. Precisamos falar sobre essas coisas. E temos de estar munidos com o que (Simon) Blakcburn e (Donald) Davidson chamam de ‘caridade epistêmica’. De ambas as partes. Porque a lei já existe. Temos de dar efetividade à lei que garante aquilo que a OAB quer colocar na PEC.”
O advogado e professor Aury Lopes Jr. é apoiador da ofensiva da OAB por considerar o tema imprescindível para a advocacia: “Uma lei federal necessariamente tem de se sobrepor ao regimento interno dos tribunais, e o direito tem de ser garantido de forma clara e efetiva, e obviamente o eventual entulhamento dos tribunais superiores por conta do volume de demandas não é um argumento válido para calar a advocacia. Já existe uma série de obstáculos para que a defesa chegue a um tribunal superior, e, ainda por cima, quando consegue chegar, não pode sustentar”.
Já o advogado e professor de Processo Penal do IDB Luís Henrique Machado prefere exaltar a importância da sustentação oral no sistema de Justiça. Ele destaca que não é incomum processos serem decididos de maneira diferente após o uso desse direito da advocacia.
“Além disso, o monocratismo exacerbado dos tribunais não pode servir, principalmente em matéria penal, de empecilho para o advogado apresentar os argumentos oralmente da tribuna. A controvérsia pede uma sincera reflexão: Justiça célere a qualquer preço ou qualidade das decisões?”._
Nas últimas semanas, de forma bastante frequente, temos discutido a questão da mediação e da arbitragem tributária e aduaneira. No começo de abril, aliás, nós duas, acompanhadas pela Camila Tapias, participamos de um debate sobre o tema promovido pelo grupo “Mulheres no Tributário” [1]. Tendo em conta a importância e a atualidade, resolvemos juntas trazer o tema para esta coluna, agora com uma perspectiva mais aduaneira.
Spacca
Contudo, antes de adentrar nesse assunto, gostaríamos de comentar que a especialização no Carf, anunciada nesta coluna, se concretizou! [2] No dia 18 de abril, houve a solenidade de lançamento das turmas aduaneiras no Carf, com a assinatura de portaria que define essa especialização: são duas turmas ordinárias na 3ª Seção que julgarão de forma preferencial as lides sobre matéria aduaneira. Importante iniciativa para a produção de decisões mais céleres e adequadas tecnicamente. Vale comemorar!
Voltando à mediação e à arbitragem, conforme observado em artigo anterior [3], após a aprovação da reforma tributária, vivemos um momento muito importante, com uma expectativa que mistura, por um lado, preocupações com a grande quantidade de lides tributárias e aduaneiras que emperram os tribunais — problema que tende a aumentar com a reforma tributária e a vinda de novas leis complementares da reforma —,[4] mas, por outro lado, com uma disposição para discutir e aprimorar esse novo sistema tributário, para torná-lo mais justo, eficiente e eficaz.
E é nesse diapasão que aparecem a mediação e a arbitragem, com o escopo de produzir soluções mais adequadas, em termos de qualidade, equidade e celeridade, aos litígios tributários e aduaneiros.
O Projeto de Lei do Senado nº 2.485/2022, que trata da mediação tributária, e o Projeto de Lei do Senado nº 2.486/2022, sobre a arbitragem tributária e aduaneira, vieram no bojo de sete anteprojetos de lei sobre processo tributário elaborados pelo grupo intitulado “Comissão de Juristas” [5], resultado do Ato Conjunto do então presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, e o presidente do Senado, senador Rodrigo Pacheco, cuja coordenação ficou a cargo da ministra Regina Helena Costa e tendo o professor Marcus Lívio Gomes como relator da “Subcomissão para Reforma do Processo Tributário”. [6]
As proposições visaram a dinamizar, unificar e modernizar o processo tributário (administrativo e judicial) nacional. Verifica-se que esse conjunto de projetos de lei volta aos holofotes do Legislativo e da academia este ano, com a perspectiva de que possam ser votados ainda no primeiro semestre de 2024, agora, sob relatoria do senador Efraim Filho.
Segundo Relatório do Conselho Nacional de Justiça de 2022, [7] 35% dos processos no Judiciário são tributários e 65% das execuções também são tributárias. Ou seja, a ineficiência do sistema tributário não apenas implica dificuldade na arrecadação e na solução dos problemas tributários, mas também atravanca todo o Judiciário, prejudicando a persecução dos demais direitos, inclusive dos fundamentais. Na seara administrativa, a situação não está melhor, apenas no Carf, o valor sob litígio atingiu a cifra de R$ 1,17 trilhão. [8]
Por outro lado, há atualmente grande preocupação em aumentar a eficiência e a eficácia do contencioso tributário; temos indicado as importantes mudanças estruturais do Carf, incluindo a especialização aduaneira e a portaria de gênero, como relevantes avanços.
Nesse contexto, o objetivo dos projetos de lei que trazem a mediação e a arbitragem para a seara tributária e aduaneira não é concorrer com o processo administrativo ou com o processo judicial fiscais. Ao contrário, é ajudar a aprimorar o contencioso, auxiliando nessa fase de início de aplicação das normas da reforma tributária (que subsistirá em concomitância com o sistema atual por largo tempo) e permanecendo para consolidar um novo e melhor sistema tributário brasileiro.
Por sua vez, quando tratamos de comércio exterior, estamos no âmbito de transações econômicas internacionais, nas quais os países, e respectivos setores privados, figuram não somente como partes, mas também como concorrentes. Isso exige muito mais estratégia, agilidade e atualização para acompanhar os movimentos e necessidades impostos pelo fluxo internacional de mercadorias e de recursos e investimentos.
Onerando pesadamente a produção, não oferecendo respostas rápidas e adequadas para os litígios, sendo ineficiente na desoneração das exportações, o sistema tributário brasileiro não apenas compromete a competitividade internacional dos produtos brasileiros, mas também prejudica o planejamento dos negócios, a atração de investimentos e o próprio crescimento econômico e social do país.
Para o setor privado, para um investidor, uma carga tributária alta sobre seu negócio representa uma necessidade de controle e organização do negócio de forma mais cautelosa, a fim de manter a lucratividade. No entanto, leis de complexa interpretação, litígios que se arrastam por décadas, soluções jurídicas imprevisíveis e contraditórias dificultam a organização e a segurança do negócio, muitas vezes, inviabilizando-o.
No mesmo sentido, no que concerne especificamente à matéria aduaneira, cujo contencioso costuma ter deslinde igual ou similar à tributária, a demora da solução de uma lide pode impossibilitar não somente negócios importantes para o setor privado e para o próprio governo brasileiro, mas impactar no fluxo internacional, afastando-nos dos grandes players.
Não é à toa que o Brasil, apesar de estar entre as dez maiores economias do mundo, ser o sexto país em termos de população e o quinto maior país do mundo em território, não tem figurado entre os 20 países que mais participam do comércio internacional; ao contrário, tem ficado com aproximadamente do 1% do comércio internacional. [9]
Nesse ponto, cumpre lembrar que o Brasil está prestes a se tornar membro na OCDE, está em processo avançado de negociação de acordo comercial com a União Europeia e ainda se encontra em fase de implementação efetiva de modernos tratados internacionais aduaneiros (como a CQR/OMA e o AFC/OMC), o que configura maior abertura econômica.
No entanto, se essa abertura vier sem maior eficiência no sistema tributário e aduaneiro, no contencioso administrativo fiscal, isso é preocupante. Nesse contexto, a liberalização pode não trazer resultados positivos, pelo contrário, sem competitividade, iremos importar mais e não conseguiremos exportar na mesma medida. Ou seja, a tendência é perder riquezas, empregos e acirrar um processo de desindustrialização que já graça no país.
Volvendo-nos especificamente aos PLs, cumpre anotar que o PL do Senado nº 2.485/2022 trata somente da mediação tributária. Temos enfatizado nas discussões desse PLP com o Legislativo e em eventos acadêmicos, que é preciso que se agregue a matéria aduaneira.
Vale lembrar que a solução de litígios via mediação é a mais desejada, por permitir que as partes se aproximem, conheçam a posição uma da outra e cheguem a uma decisão consensual — ou seja, não imposta — e muito mais rápida.
Anote-se que, se precisamos de soluções céleres sem comprometimento da justiça, qualidade e tecnicidade para questões tributárias, isso é ainda mais premente na seara aduaneira, que se relaciona diretamente com o dinâmico e competitivo comércio internacional.
Na mediação, a Secretaria da Receita Federal e a Procuradoria da Fazenda Nacional também poderão propor a medida alternativa. O sujeito passivo não precisará estar representado por terceiro. As hipóteses passíveis de solução alternativa serão definidas em ato conjunto do advogado-geral da União e do ministro da Economia.
Prazo
Uma vez instaurada a mediação, o prazo administrativo ou judicial ficará suspenso por 30 dias, prorrogável por igual período. A mediação poderá ser instaurada ainda no curso do procedimento fiscal e, acaso estabelecido o dever de pagar o tributo, terá o sujeito passivo direito à redução de 70% no valor da penalidade prevista no artigo 44, inciso I, da Lei 49.430/1997 e, uma vez não cumprido o acordado, o débito será diretamente inscrito em dívida ativa.
O PL 2.485, por seu turno, já prevê a arbitragem tributária e também aduaneira. É necessário evidenciar que a arbitragem precisa envolver também todas as questões aduaneiras pecuniárias, bem como o perdimento de mercadorias, veículos e moeda. Importante contemplar ainda na arbitragem (e também na mediação) as medidas de defesa comercial, em relação à quais são comuns litígios de elevado valor, na maioria das vezes envolvendo classificação fiscal das mercadorias importadas.
A arbitragem tributária e aduaneira poderá ser instaurada desde a ciência do auto de infração e caberá à Administração Pública a eleição da temática passível de submissão a tal método. O “compromisso arbitral” inaugura o procedimento e representa o marco interruptivo da prescrição.
Não será passível sua aplicação por equidade, quanto à discussão de constitucionalidade ou discussão de lei em tese, bem como, resta vedada sentença que resulte em regime especial, diferenciado ou individual de tributação, de modo direto ou indireto.
Devem ser observados os precedentes vinculantes e de repercussão geral, sob pena de nulidade da decisão arbitral e a decisão deverá ser proferida em doze meses, prorrogável por igual período.
O texto do PLP estabelece três momentos em que permite a redução da multa, quanto mais próximo do início da ocorrência do evento sujeito à tributação, maior a redução (60% antes da ciência do auto de infração, 30% após tal prazo e antes da primeira decisão administrativa e 10% antes da decisão de segunda instância, da inscrição em dívida ou da citação da Fazenda em processo judicial).
Os dois projetos de leis inovam o sistema jurídico, fundam-se na consensualidade das partes envolvidas e permitem dúplice solução; primeiro, estimulam a prevenção consensual de conflitos em âmbito administrativo e judicial. Em segundo, à resolução dos litígios já instaurados. Esta função será primordial para redução do estoque de litígios do atual sistema tributário sobre o consumo, ao lado de outros fenômenos como a transação e o negócio jurídico processual.
Ambos os projetos contam com a possibilidade de presença de mediadores e árbitros internos e externos aos quadros do ente público titular do crédito público. Abre-se aqui uma nova vertente de atuação aos profissionais da iniciativa privada.
No que vale anotar que hoje a mediação aplica-se somente à União Federal, mas, do lado do sujeito passivo, é possível e permitido que seja representado por coletividade, entidades de classe ou associações; já a arbitragem é válida para todos os entes públicos de direito interno (municípios, estados e União), bem como, a conselhos profissionais e à Ordem dos Advogados do Brasil. Eis que tais entidades contribuem muito com a alta litigiosidade nos tribunais brasileiros.
Assim, a expectativa é que a mediação e a arbitragem passem pelo Legislativo e possam ser aplicadas para matérias tributárias e também aduaneiras, agregando mais justiça, agilidade e qualidade ao contencioso brasileiro e trazendo muitos resultados positivos para o país. Vamos acompanhar os projetos de lei!_
Lei das ‘saidinhas’ deixa lacuna e insufla poder do juiz para decidir prazos
Sancionada com vetos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a Lei 14.843/2024, que alterou as regras da saída temporária da prisão, dispostas na Lei de Execução Penal (LEP), deixou uma lacuna sobre o período máximo para concessão do benefício, ou seja, o tempo que o preso pode passar fora da cadeia caso seu regime assim permita.
Lula vetou supressão da ‘saidinha’, mas lei ficou com lacuna sobre prazos
Com o vácuo legislativo, esse espaço será preenchido pelo juiz, que, em cada caso, vai estabelecer quando o preso deve voltar para o presídio.
Ainda que Lula tenha vetado a supressão da saída temporária, a lei entrou em vigor com a total revogação do artigo 124 da LEP, cuja redação era a seguinte: “A autorização será concedida por prazo não superior a 7 (sete) dias, podendo ser renovada por mais 4 (quatro) vezes durante o ano”.
Mesmo com os vetos do presidente, a nova lei é considerada problemática por uma série de fatores, em especial a corrosão de um instituto criado durante a ditadura militar para a ressocialização de presos, a popular “saidinha”. E a lacuna deixada aberta pelos legisladores vai impulsionar o poder discricionário dos juízes, que podem seguir jurisprudências consolidadas ou julgar por analogia.
Lista de problemas
O buraco legislativo entrou na lista das críticas à norma sancionada por Lula. A volta do exame criminológico, tido como inviável por estudiosos do assunto, encabeça essa relação. A obrigatoriedade do exame deve, na prática, dificultar a progressão de regime e inflar ainda mais o sistema carcerário brasileiro, que hoje restringe a liberdade de mais de 900 mil pessoas.
Quarenta anos após a aprovação da LEP, avaliam advogados criminalistas entrevistados pela revista eletrônica Consultor Jurídico, a lei regrediu e, além de prejudicar a ressocialização, deixou um espaço que, se não for preenchido por algum tipo de regulação, atribuirá ao juiz da execução um poder que ele nunca teve. Além disso, criou-se o risco de precedentes controversos na matéria.
“Com exceção da saída para frequentar curso profissionalizante ou de instrução, que segue pelo prazo necessário para o cumprimento das atividades (art. 122, § 3º), a saída temporária para visita familiar ou atividades de convívio social não possui mais a expressa delimitação da quantidade de dias por saída e o seu número durante o ano”, alerta Tiago Rocha, do escritório Bottini & Tamasauskas.
A delimitação do tempo para a saída temporária, diz Rocha, terá uma carga discricionária do magistrado que “deveria seria evitada”.
“Para que não haja uma dessintonia na fruição desse direito, que é previsto na Lei de Execução Penal com um prazo específico, provavelmente os juízes permanecerão aplicando esse prazo dos sete dias, renovado por mais quatro vezes ao ano”, diz Renato Vieira, sócio do Kehdi Vieira Advogados e presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM).
“Se não houver um disciplinamento novo, legislativo, ou os juízes não seguirem com o que já vem sendo decidido desde 1984, o próprio artigo 122 (que regula as saídas temporárias, mantido pelo governo Lula) não vai ter nenhuma eficácia”, afirma Vieira.
Inexplicável
A pressa do legislador, sempre pressionado por questões sociais quando o tema é segurança e sem o devido estudo do tema, gerou lacunas “inexplicáveis” como essa, diz Pedro Beretta, sócio-gestor do Hofling Sociedade de Advogados. “Certamente (o vácuo) terá um impacto gigante no atual sistema carcerário brasileiro — que, como é sabido, não é detentor dos melhores resultados.”
Em relação às consequências desse vácuo, ele diz que “a volta e o tempo de permanência deverão ser avaliados por cada juiz, simples assim”.
Pamela Torres Villar, sócia do Salomi Advogados, diz que, conforme determina o Decreto-Lei 4.657/1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), os juízes devem, em caso de omissão legislativa, decidir de acordo com “a analogia, os costumes e os princípios gerais do Direito”.
“Desse modo, inexistindo balizas legais que estabeleçam por quanto tempo o benefício poderá se estender ou, mesmo, se há ou não limites à sua concessão, caberá, em um primeiro momento, ao magistrado, no caso concreto, aplicar a solução que entender adequada, a qual pode coincidir com os parâmetros estabelecidos pela lei anterior”, argumenta a advogada.
Renato Vieira, por sua vez, acredita que o fato de o governo ter vetado o fim das “saidinhas” é um sinal de que o retorno do preso ao convívio em sociedade deve ser tratado como era antes.
“As razões do veto passam por uma necessária reintegração, ou seja, não se pode tornar sem efeito a previsão da saída temporária. Então, a única forma de não se tornar sem efeito a saída temporária é, no mínimo, seguir o que já vinha sendo previsto, ou lhe conferir, inclusive, maior amplitude.”
Para Fabio Fajolli, professor e mestre em Direito Penal pela PUC-SP, há o perigo de o vácuo legal ser preenchido por decisões muito distintas entre si. “Corre-se o risco de surgirem precedentes controversos, ou casos similares com prazos de saída absolutamente diferentes. Em outras palavras, cria-se insegurança jurídica.”
A lei sancionada, diz o advogado, muda pouco a prática do que já ocorre. E ele sustenta que a suposta insegurança causada pelas saídas temporárias é “ilógica”.
“Quem faz jus ao benefício da saída temporária são os condenados que cumprem pena em regime semiaberto. Assim, esses indivíduos já têm ‘livre acesso’ à sociedade, vez que podem sair para trabalhar durante o dia.”_
TJ-GO rejeita ação de improbidade com base em regra da nova LIA
Com a aplicação imediata da nova Lei de Improbidade Administrativa (LIA) aos casos em andamento, de acordo com tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal, as condutas dos réus precisam se enquadrar em uma das hipóteses da lista (agora taxativa) de atos de improbidade que atentam contra os princípios da administração pública, prevista no artigo 11 da norma.
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Nova LIA transformou lista do artigo 11 em taxativa e revogou inciso I
Assim, a 5ª Turma Julgadora da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás rejeitou uma ação contra uma empresa e quatro pessoas por improbidade administrativa.
O Ministério Público estadual buscava a condenação por dispensa indevida de licitação. O órgão atribuía aos réus a prática de “ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência”, como previsto na antiga redação do inciso I do artigo 11 da LIA original, de 1992.
Mas a defesa, feita pelos advogados Dyogo Crosara e Heitor Simon, lembrou que a nova LIA aboliu esse inciso e transformou a lista do artigo 11 em taxativa — ou seja, somente as condutas previstas nos demais incisos configuram ato de improbidade na modalidade de lesão a princípios da administração pública.
A 5ª Vara de Fazenda Pública de Goiânia concordou e rejeitou a ação, sem constatar indícios da prática de atos de improbidade. No TJ-GO, o juiz substituto Ricardo Luiz Nicoli, relator do caso, também acolheu a argumentação da defesa.
O magistrado argumentou que o STF, em 2022, decidiu que a nova LIA — exceto em suas previsões quanto a prazos prescricionais — se aplica aos processos em curso, salvo aqueles com condenação transitada em julgado.
Segundo ele, embora os réus tenham sido “negligentes quanto à realização do procedimento correto para a inexigibilidade de licitação”, não há ato de improbidade.
Além da revogação do inciso I, Nicoli destacou a falta de comprovação da prática de sobrepreço, de pagamentos sem contraprestação ou de algo que causasse efetivo prejuízo aos cofres públicos._
Exame criminológico é inviável e vai barrar progressões de regime, afirmam criminalistas
A recém-sancionada Lei 14.843/2024, fruto de um projeto do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), virou assunto nacional e gerou críticas por restringir a saída temporária de presos, a popular “saidinha”. E um outro ponto da norma também vem causando descontentamento no meio jurídico: a exigência do exame criminológico para a progressão de regime prisional em todos os casos.
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Nova lei exige exame criminológico para autorizar progressão de regime
Estudiosos do assunto consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico entendem que o Estado não terá condições de promover todos os exames e dizem que eles são pseudocientíficos e usados, na prática, para prolongar a estadia dos condenados na cadeia.
O exame consiste em uma avaliação psicológica que decide se o detento tem chances de voltar a cometer crimes caso passe para o regime semiaberto ou o aberto.
Um trecho específico sobre a progressão ao regime aberto diz que o condenado precisa apresentar “fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina, baixa periculosidade e senso de responsabilidade, ao novo regime”.
Antes da nova lei, o exame criminológico podia ser estipulado pelo juiz conforme as peculiaridades do caso, desde que a decisão fosse devidamente motivada. O teste era obrigatório para a progressão de regime até 2003. Tal regra foi extinta naquele ano pela Lei 10.792.
Sem condições
O advogado criminalista Alberto Zacharias Toron lembra que a obrigatoriedade foi extinta em 2003 porque “o Estado brasileiro não tinha condições de, em um tempo razoável, realizar esses exames”.
Isso também é ressaltado pelo criminalista Cristiano Maronna, diretor do Justa, centro de pesquisa que atua no campo da economia da Justiça. Segundo ele, o exame criminológico é caro e “o Estado não tinha condição” de fornecê-lo.
Para Toron, o Congresso teve agora uma “atitude demagógica” e reeditou o “populismo penal”. O advogado classifica a Lei 14.843/2024 como um “retrocesso”, pois considera que é desnecessário fazer o exame criminológico em todos os casos. Além disso, “o Estado brasileiro também não se aparelhou” para promover os exames “em tempo breve”.
Cássio Thyone, membro do conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e perito aposentado da Polícia Civil do Distrito Federal, não sabe dizer como a nova lei vai ser aplicada. Segundo ele, para a exigência sair do papel, o governo precisaria ter “vontade política” para disponibilizar o exame.
Na sua visão, “faz todo o sentido discutir se o Estado é capaz de cumprir o que ele próprio estipulou em uma lei como essa”.
Hoje, o país não tem “condições logísticas para atender à demanda de realização de todos os exames criminológicos”, segundo Thyone. Ele lembra que o Brasil já possui uma demanda represada de exames.
Thyone ressalta que o teste “não é feito a toque de caixa”, pois não se trata de apenas preencher um formulário. Os psiquiatras e psicólogos forenses precisam fazer várias entrevistas e aplicar questionários aos condenados.
Números
Uma nota técnica elaborada por 69 organizações — entre elas o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), o Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-SP), a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) e Defensorias Públicas de 17 estados — avaliou as prováveis consequências da exigência com base em dados oficiais.
As entidades apontam que a imposição trará um impacto orçamentário enorme para a União e os estados, que precisarão contratar profissionais. Ou seja, “a restituição do exame criminológico como obrigação para progressão de regime vai onerar o Estado”, conforme aponta Maronna.
A Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo (SAP-SP), por exemplo, conta hoje com apenas 230 agentes técnicos de assistência à saúde nas suas unidades prisionais. A população carcerária paulista é de cerca de 200 mil pessoas, das quais aproximadamente 46,8 mil progrediram de regime em 2022.
De acordo com a SAP-SP, cada exame criminológico custa R$ 649 aos cofres públicos. O valor diz respeito apenas à remuneração dos profissionais credenciados, sem contar os gastos com recursos materiais.
Conforme os cálculos das organizações signatárias da nota técnica, caso a Lei 14.843/2024 já estivesse em vigor em 2022, São Paulo teria gastado mais de R$ 30 milhões somente para fazer o exame prévio a todas as progressões.
E esse valor é uma estimativa mínima, pois não considera os gastos excedentes dos casos nos quais o exame tenha de ser repetido devido à negativa da progressão de regime.
Dados do Tribunal de Justiça de São Paulo mostram que, em 2023, foram autuados aproximadamente 102 mil pedidos de progressão de regime no estado (concedidos ou não). Pela projeção das entidades, se a nova lei já estivesse em vigor no ano passado, o gasto com os exames teria sido superior a R$ 66 milhões. Esse número é seis vezes maior do que todo o orçamento de políticas estaduais para egressos do sistema prisional.
A conclusão das organizações é que a norma gera despesas obrigatórias sem previsão no orçamento, o que é inconstitucional. Durante sua tramitação no Congresso, o texto não foi acompanhado de uma estimativa de impacto orçamentário e financeiro, ou mesmo de uma previsão de origem dos recursos.
Segundo o defensor público Bruno Shimizu, doutor em Criminologia e diretor do IBCCRIM, a nova regra compromete “as equipes técnicas, com sacrifício de outros investimentos públicos mais relevantes”.
Maronna diz que a exigência torna “o sistema progressivo no cumprimento das penas privativas de liberdade ainda mais problemático, porque dependente desse exame que o Estado não tem condição de bancar”.
Trancafiados por mais tempo
Há ainda a previsão de aumento da população carcerária e da demanda por vagas, já que os processos devem tramitar de forma mais lenta enquanto os exames não são feitos.
“Na prática, o exame é apenas um expediente protelatório no processo de execução, que atrasa os processos e consome recursos públicos”, pontua Shimizu.
Alberto Toron lembra que, antes de 2003, a exigência era “um meio que se tinha para manter o preso no regime mais constritivo por mais tempo do que a lei permitia, como se fosse um expediente extrapenal, ligado à deficiência do Estado desaparelhado para realização desses exames”.
De acordo com Maronna, “tudo aquilo que dependia do exame criminológico acabava ficando atrasado, porque o Estado não conseguia fornecer profissionais responsáveis pela elaboração desse exame”.
Com o retorno da regra, segundo Toron, os presos vão “ficar mais tempo na fila aguardando a progressão do regime prisional por conta da deficiência do Estado”.
Isso vai causar, na visão de Maronna, uma “dificuldade de acesso a direitos por parte dos presos, que já são uma parcela da população vitimada pela negação de direitos”. E Toron prevê que haverá “uma enxurrada de Habeas Corpus” para questionar a permanência dos detentos no regime mais grave, “porque isso representa um constrangimento ilegal”.
Já para Maronna, o impacto vai além da diminuição do número de presos que progredirão de regime. Ele também vê como consequência “a piora da disciplina no sistema prisional” e o provável aumento de rebeliões e motins nas prisões.
Pseudociência
“A alteração legal, sem qualquer estudo de impacto financeiro ou humano, insiste na alocação de recursos para a realização de exame pseudocientífico”, assinala Shimizu.
Ele recorda que o Conselho Federal de Psicologia (CFP) e o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) têm manifestações que apontam a “imprestabilidade” do exame criminológico “para a previsão de eventual reincidência”.
De acordo com a nota técnica das 69 entidades, a nova lei vai comprometer a função primordial das equipes técnicas prisionais, que é a atenção psicossocial aos presos e seus familiares.
Cristiano Maronna afirma que o exame é “uma tentativa de identificar práticas futuras de crime”. Isso não tem base científica, pois é “muito difícil” prever se alguém vai ou não voltar a praticar crimes.
Já o criminalista Aury Lopes Jr., professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), diz que a nova lei é um “retrocesso” e um “erro histórico que já experimentamos e não deu certo”.
Para além da falta de estrutura do Estado, Lopes Jr. destaca que “toda e qualquer avaliação sobre a personalidade de alguém é inquisitiva”, pois estabelece “juízos sobre a interioridade do agente que não são comprováveis e tampouco refutáveis”.
Essa avaliação “também é autoritária, devido às concepções naturalistas em relação ao sujeito autor do fato criminoso”.
Ele ainda considera que o exame criminológico é “juridicamente imprestável” e “incompatível com o sistema de garantias previsto na Constituição”.
“Como me defender do argumento de que sou ‘perigoso’?”, indaga o criminalista. “Ou que tenho ‘tendência criminosa’? Que minha personalidade é desviada?”.
Missão impossível
Segundo Lopes Jr., é impossível “entrar na cabeça” de alguém e avaliar sua personalidade, seu caráter e suas perspectivas de futuro para decidir sobre a progressão de regime.
O advogado ressalta que a Psicologia e a Psiquiatria “se destinam a contribuir para que as pessoas vivam melhor, tenham melhores condições de vida, administrem suas patologias e ansiedades, de forma a reduzir danos”. Tais áreas do conhecimento nunca tiveram o objetivo de ser usadas para punir alguém ou aumentar seu tempo na cadeia.
“O Direito se apropria do discurso clínico para, sem elementos objetivos e concretos e distorcendo o conhecimento clínico, punir mais severamente”, pontua o criminalista.
Há ainda o problema do silêncio durante o exame. Lopes Jr. aponta que a avaliação pode “extrair efeitos negativos pelo exercício do direito de silêncio”.
Isso não deveria acontecer, já que o condenado não é obrigado a colaborar ou a falar. Ou seja, o direito de se calar não pode trazer “prejuízo jurídico para o agente”.
Mas, segundo o criminalista, no sistema carcerário “ainda dominam a inquisição e a velha culpa judaico-cristã”. Na prisão, o condenado é incentivado a reconhecer o erro e se arrepender do mal praticado, “pois só assim salvará sua alma do inferno”._
Volume de prisões preventivas mantém execução antecipada viva no Brasil
A Turma Recursal Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu Habeas Corpus a um estudante de educação física que estava sendo investigado por suposto exercício ilegal da profissão. A decisão trancou a acusação criminal.
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Estudante fazia estágio em academia de ginástica
O estudante exercia a função de estagiário dentro de uma academia de ginástica, sob supervisão. Em fiscalização, o Conselho de Educação Física considerou que o estagiário estaria exercendo ilegalmente a profissão de educador físico, pois não tinha inscrição no Conselho para exercer o estágio.
O Ministério Público do estado de São Paulo requereu a instauração de procedimento para apuração do caso. Foi formalizado um acordo entre o réu e o Ministério Público, consistindo no pagamento de R$ 1.412 em multa.
Um grupo de advogados, no entanto, entrou com pedido de Habeas Corpus em favor de Pereira, alegando que o estudante estava sofrendo coação ilegal em razão da atipicidade da conduta.
Segundo os impetrantes, o jovem estava fazendo um estágio devidamente autorizado pela universidade e supervisionado por um profissional habilitado, não havendo ilegalidade em suas atividades.
A defesa ressaltou que o Conselho Regional de Educação Física não exige a inscrição no conselho para exercer as funções de estagiário, e que a situação do cliente estava regular perante a faculdade.
Com base na atipicidade da conduta, o relator do caso, Jurandir de Abreu Júnior, votou por revogar o acordo de transação penal anteriormente firmado e determinar o arquivamento do termo circunstanciado. A decisão foi unânime.
A sentença foi fundamentada na inexistência de indícios de autoria e prova da materialidade delitiva, conforme os princípios legais. O pedido de HC foi impetrado por advogados dos escritórios Stuque, Freitas e Ficher e Alamiro Velludo Salvador Netto._